Depois que a plataforma de mídia social X foi banida no Brasil na semana passada, cientistas do país começaram a procurar freneticamente por outro fórum online postar sobre suas pesquisas, comunicar-se com colegas e manter-se atualizado sobre os avanços científicos. “Acompanhar revistas e pessoas importantes é o que me mantém atualizada”, diz Regina Rodrigues, oceanógrafa física da Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópolis, Brasil.

Alguns se sentem isolados por causa da mudança. “Perdi contato com colegas e grupos de pesquisa europeus dos quais participei durante meu pós-doutorado na Espanha”, diz Rodrigo Cunha, pesquisador de comunicação da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife, Brasil.

Outros são mais tranquilos e apontam que muitos pesquisadores já o fizeram X (anteriormente Twitter)., depois que o bilionário Elon Musk o comprou e mudou suas políticas, incluindo aquelas sobre moderação de conteúdo e confirmação de usuários como “verificados” ou como fonte confiável de informação. Sabine Righetti, pesquisadora de comunicação científica da Universidade Estadual de Campinas, no Brasil, deixou a plataforma no início do ano passado devido ao que considerou um aumento de mensagens agressivas, especialmente contra cientistas, jornalistas e mulheres. “Eu sou todas essas três coisas”, diz ela.

Ronaldo Lemos, principal cientista do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, diz que a proibição pode fornecer uma ideia de como seria o mundo sem o X. As redes sociais vêm e vão, diz ele, apontando para algumas que fecharam, como o Orkut do Google, que fechou em 2014 e já foi popular no Brasil. “As pessoas estão se adaptando e procurando formas de reconstruir suas redes em outros lugares”, diz ele.

Expressão livre

Em 30 de agosto, o juiz do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes ordenou a proibição após um conflito de meses com Musk sobre os limites da liberdade de expressão.

No início do mês passado, de Moraes emitiu uma ordem judicial encerrando uma série de contas consideradas como disseminadoras de desinformação e desestabilizadoras da democracia brasileira. A empresa não cumpriu e fechou seu escritório no Brasil cerca de duas semanas depois. De Moraes emitiu então uma ordem exigindo que X nomeasse um novo representante legal no país, uma vez que o anterior não cumpriu as ordens judiciais. X ignorou a ordem, o que levou à proibição. Na semana passada, a Suprema Corte do Brasil manteve a sentença de Moraes - que inclui uma multa de US$ 9.000 por dia para qualquer um dos mais de 200 milhões de brasileiros pegos usando X através de uma rede privada virtual (VPN) ou outros meios. (Uma VPN normalmente criptografa os dados de um usuário e disfarça seu endereço IP.) Isso é mais do que a maioria dos brasileiros ganha em um ano.

Links, Alexandre de Moraes; Rechts, Elon Musk Portraits

Durante anos, os cientistas têm usado o X não apenas para Comentários sobre pesquisas, conversas com colegas e busca de novos colaboradores mas também para promover o seu trabalho e corrigir mal-entendidos. Por exemplo, durante a pandemia de COVID-19, Átila Iamarino, microbiologista e comunicadora científica em São Paulo, Brasil, tornou-se uma fonte preferencial sobre o coronavírus SARS-CoV-2, alcançando mais de um milhão de seguidores. “Foi o lugar onde me envolvi com colegas, reuni argumentos para transmissões ao vivo e desmascarei a desinformação à medida que surgiam.”

Karina Lima, climatologista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, Brasil, sente falta da plataforma porque foi um lugar onde ela obteve oportunidades e alcançou muitas pessoas através de seu trabalho de divulgação científica. Mas reconhece que as redes sociais não devem ser “um espaço sem lei que fomenta o discurso de ódio e a desinformação”.

Em julgamento em outro lugar

Apesar do aumento deste tipo de notícias após a aquisição de Musk 1alguns pesquisadores persistiram. Letícia Sallorenzo, pesquisadora de linguística da Universidade de Brasília, ainda achou a ferramenta útil. Antes da proibição, ela estudava discursos de ódio online dirigidos a Moraes. A proibição a impediu de realizar esse trabalho, e ela deve pedir ao tribunal permissão para usar o X em uma rede privada virtual para continuar.

Cientistas de fora do Brasil também sentem a perda do X no país. Embora tenha se tornado uma rede menos confiável para os cientistas, “há pesquisadores e instituições brasileiras com quem posso colaborar”, diz Jonathan Vicente, pesquisador de mudanças climáticas e saúde da Universidade de Berna, na Suíça.

Mais de dois milhões de pessoas no Brasil já migraram para outra plataforma de mídia social chamada Bluesky. “É a plataforma que mais lembra o Twitter quando começou”, diz Iamarino. Os cientistas também estão testando, assim como outras plataformas como mastodonte e fios, diz Lemos. A boa notícia é que “não é como se o Twitter tivesse parado e não houvesse alternativa”, acrescenta.

Mas reconstruir as redes sociais online pode ser difícil, especialmente para investigadores de países de baixo rendimento e com pouca visibilidade, diz Rodrigues. “É difícil construir uma rede de colegas, especialmente se você não é um nome conhecido”, diz ela.

Para Iamarino, fica claro qual plataforma ganhou entre os usuários quando eles passam a conferir as mensagens nela antes de dormir. Ele começa a se sentir assim em relação a Bluesky. “Coloquei o aplicativo onde o Twitter ficava no meu telefone”, diz ele.